O Ministério do Meio Ambiente (MMA) fará uma análise técnica sobre o impacto do Código Florestal, aprovado quarta-feira (25) na Câmara dos Deputados. O secretário de Biodiversidade e Florestas do ministério, Roberto Cavalcanti, informou na quinta-feira (26) que o pedido é da ministra Izabella Teixeira.
O texto aprovado pelos deputados não agradou ao governo que apoiava a versão apreciada pelo Senado Federal em dezembro, nem a especialistas ambientais e nem a cientistas.
"O Ministério do Meio Ambiente terá de fazer uma avaliação em resposta à uma orientação superior", disse o secretário, em audiência realizada na Comissão do Meio Ambiente para avaliar o impacto da nova legislação.
Mediada pelo líder do Partido Verde, deputado Sarney Filho (PV-MA), a audiência teve a presença de especialistas em meio ambiente e de acadêmicos que criticaram com veemência a decisão da Câmara. Eles esperam que a presidente Dilma Rousseff vete o texto para reverter os retrocessos que o Código representa para a sustentabilidade ambiental nacional. A avaliação majoritária é de que o texto aprovado pelos deputados atende a negociações políticas e à bancada ruralista.
Crime ambiental - O consultor da Ackerman Consultoria Ambiental, Márcio Ackermann, chamou de "irresponsáveis" os deputados que aprovaram o Código Florestal que, segundo avalia, representa um "crime" à biodiversidade brasileira.
Com opinião semelhante, o senador Rodrigo Rollemberg (PSB-DF), presidente da comissão que analisou o Código no Senado, e iniciou a sessão na comissão, lamentou o retrocesso ocorrido na Câmara dos Deputados. Ele enumerou os principais problemas do novo texto que deverá levar à uma insegurança jurídica, considerando que toda a negociação política costurada no Senado foi perdida e pediu para a presidente Dilma exercer o seu direito de veto, a mesma opinião de Sarney Filho.
"Apesar de falar de um tema quase pós-morte, acredito que perdemos a batalha, mas não perdemos a luta", complementou o sociólogo Sérgio Sauer, professor da Universidade de Brasília (UnB), que tem foco em reforma agrária e em desenvolvimento rural sustentável.
Em sua palestra, o secretário de Biodiversidades e de Florestas do ministério disse que as discussões sobre o Código Florestal, mesmo que esteja aprovado, ainda não se esgotaram e que o resultado da votação não representa uma derrota para o governo. “Temos de fazer uma análise técnica em relação à votação do Código ", explicou Cavalcanti.
As análises da equipe técnica do MMA serão nos aspectos ecológicos, no impacto das mudanças do regime de proteção aos processos de ecossistemas e de sustentabilidade dos processos biológicos. Já no que se refere à anistia às multas de produtores rurais, Cavalcanti respondeu que não cabe ao órgão analisar os pontos jurídicos do Código.
Exigências internacionais - Independentemente da aprovação do polêmico Código Florestal na Câmara, Cavalcanti acredita que permanecem os problemas para o produtor rural sobre as cobranças do mercado internacional na segurança alimentar alinhada à sustentabilidade no campo.
Como exemplo, ele afirmou que uma comissão da China desembarcou em Brasília, na semana passada, interessada nas políticas brasileiras destinadas à proteção da biodiversidade, combinadas com a produção de alimentos, para os próximos dez ou 15 anos. Hoje, a China é um dos principais importadores de commodities agrícolas e minerais do Brasil.
Diante de tal cenário, Cavalcanti avalia que o desafio de associar a produção e preservação ambiental e florestal interessa a todos os setores, tanto os ambientalistas quanto o agronegócio.
Políticas públicas - Nesse contexto, Cavalcanti destacou que o desafio de adotar políticas públicas para a preservação ambiental implica em um conjunto de ações que podem ser alcançadas com outros mecanismos. "O Código Florestal não é o único e nem sua aprovação no Congresso Nacional fecha a questão", analisou. Para ele, é preciso discutir planejamento de médio e longo prazos, já que trata-se de uma questão que diz respeito também à economia brasileira.
Dessa forma, ele conclui que a missão do MMA não muda com o novo Código Florestal no que se refere à sustentabilidade dos ecossistemas e recomendação para proteção das nascentes. "O Código Florestal faz diferença porque é uma legislação federal, mas todas as questões de sustentabilidade do agronegócio estão na mesa de todo dia", disse ele, que reconhece, entretanto, que o Código Florestal é o instrumento que norteia o agricultor.
Avaliação de especialistas – O sociólogo Sérgio Sauer, professor da UnB, considera que o novo Código Florestal foca o imediatismo na produção de alimentos para atender à demanda internacional, ignorando os danos à biodiversidade em longo prazo.
Segundo ele, uma das principais consequências da nova legislação ambiental será sobre a contaminação da água, pelo forte uso de agrotóxico nas áreas florestais, comprometendo a segurança alimentar.
Sauer avalia que os argumentos usados pelos deputados na aprovação do Código centram no tripé: produção de alimentos, exportação de commodities e no contexto de ilegalidade à maioria dos pequenos produtores rurais. Ainda que o argumento usado alegue a produção de alimentos, Sauer observa que o Brasil hoje avança muito na produção de grãos, principalmente de complexo soja (grão, farelo e óleo) para exportação, enquanto recua na produção de alimentos, como arroz, principalmente na região Sul do País, feijão e mandioca (a produção dessa última está estável há 20 anos).
Ele também considerou ilegal o não ressarcimento dos produtores rurais à sociedade pela exploração do solo brasileiro para o plantio agrícola.
APPs versus enchentes nas cidades – O consultor da Ackermann Consultoria Ambiental, Márcio Ackermann, rebateu a opinião do secretário de Biodiversidade e de Florestas do Meio Ambiente de que o novo Código Florestal não pode ser o único mecanismo usado na proteção florestal do País. "Ele representa muito. É um crime que está sendo cometido aqui [na Câmara dos Deputados]. Espero que a presidente Dilma reverta o que foi aprovado aqui", disse Ackermann, geógrafo pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP), mestre pelo Instituto Tecnológico de São Paulo (IPT/SP) e que possui 25 anos de experiência na área ambiental.
Ele chamou de "irresponsáveis” os deputados que ignoraram a importância que exercem as Áreas de Preservação Permanentes (APPs) nas áreas urbanas e na zona rural. "Aqui o debate foi em defesa das grandes propriedades de terras e da produção agrícola. O escopo geral não foi republicano e nem de proteção ao bem público", analisou.
Prejuízos à sociedade civil - Segundo ele, a ocorrência de enchentes e alagamentos em capitais, como São Paulo, por exemplo, é reflexo da falta de aplicação da legislação de APPS, gerando às vezes mais prejuízos à sociedade do que o reflorestamento estratégico nas cidades. Segundo ele calcula, cada enchente que ocorre na capital paulista, por exemplo, gera prejuízos de R$ 65 milhões. Além disso, são desembolsados R$ 300 milhões para construção de cada piscinão de 300 metros quadrados (m2). Ele citou o caso da Avenida Paulista, o coração da cidade de São Paulo, ainda que seja uma APPs em um topo de morro, "ninguém" sugere o reflorestamento dela em sua plenitude. "Temos instrumentos tecnológicos que podem ajudar nessas questões (a melhorar o reflorestamento da avenida)", disse. Ele acrescenta que mais de 50% das residências de famílias de baixa renda, de algumas capitais brasileiras, estão assentadas em APPs, às margens de rios.
Baseados em estudos do IPT, o geógrafo acrescentou que a poluição de rios que cortam a capital paulista, como o Tietê, faz com que o déficit hídrico paulistano seja semelhante ao do Nordeste. Conforme conclui o consultor, em vez de o Brasil avançar nas políticas públicas voltadas ao reflorestamento e de reversão de déficit hídrico retrocede 50 anos.
(Viviane Monteiro - Jornal da Ciência)
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"O Ministério do Meio Ambiente terá de fazer uma avaliação em resposta à uma orientação superior", disse o secretário, em audiência realizada na Comissão do Meio Ambiente para avaliar o impacto da nova legislação.
Mediada pelo líder do Partido Verde, deputado Sarney Filho (PV-MA), a audiência teve a presença de especialistas em meio ambiente e de acadêmicos que criticaram com veemência a decisão da Câmara. Eles esperam que a presidente Dilma Rousseff vete o texto para reverter os retrocessos que o Código representa para a sustentabilidade ambiental nacional. A avaliação majoritária é de que o texto aprovado pelos deputados atende a negociações políticas e à bancada ruralista.
Crime ambiental - O consultor da Ackerman Consultoria Ambiental, Márcio Ackermann, chamou de "irresponsáveis" os deputados que aprovaram o Código Florestal que, segundo avalia, representa um "crime" à biodiversidade brasileira.
Com opinião semelhante, o senador Rodrigo Rollemberg (PSB-DF), presidente da comissão que analisou o Código no Senado, e iniciou a sessão na comissão, lamentou o retrocesso ocorrido na Câmara dos Deputados. Ele enumerou os principais problemas do novo texto que deverá levar à uma insegurança jurídica, considerando que toda a negociação política costurada no Senado foi perdida e pediu para a presidente Dilma exercer o seu direito de veto, a mesma opinião de Sarney Filho.
"Apesar de falar de um tema quase pós-morte, acredito que perdemos a batalha, mas não perdemos a luta", complementou o sociólogo Sérgio Sauer, professor da Universidade de Brasília (UnB), que tem foco em reforma agrária e em desenvolvimento rural sustentável.
Em sua palestra, o secretário de Biodiversidades e de Florestas do ministério disse que as discussões sobre o Código Florestal, mesmo que esteja aprovado, ainda não se esgotaram e que o resultado da votação não representa uma derrota para o governo. “Temos de fazer uma análise técnica em relação à votação do Código ", explicou Cavalcanti.
As análises da equipe técnica do MMA serão nos aspectos ecológicos, no impacto das mudanças do regime de proteção aos processos de ecossistemas e de sustentabilidade dos processos biológicos. Já no que se refere à anistia às multas de produtores rurais, Cavalcanti respondeu que não cabe ao órgão analisar os pontos jurídicos do Código.
Exigências internacionais - Independentemente da aprovação do polêmico Código Florestal na Câmara, Cavalcanti acredita que permanecem os problemas para o produtor rural sobre as cobranças do mercado internacional na segurança alimentar alinhada à sustentabilidade no campo.
Como exemplo, ele afirmou que uma comissão da China desembarcou em Brasília, na semana passada, interessada nas políticas brasileiras destinadas à proteção da biodiversidade, combinadas com a produção de alimentos, para os próximos dez ou 15 anos. Hoje, a China é um dos principais importadores de commodities agrícolas e minerais do Brasil.
Diante de tal cenário, Cavalcanti avalia que o desafio de associar a produção e preservação ambiental e florestal interessa a todos os setores, tanto os ambientalistas quanto o agronegócio.
Políticas públicas - Nesse contexto, Cavalcanti destacou que o desafio de adotar políticas públicas para a preservação ambiental implica em um conjunto de ações que podem ser alcançadas com outros mecanismos. "O Código Florestal não é o único e nem sua aprovação no Congresso Nacional fecha a questão", analisou. Para ele, é preciso discutir planejamento de médio e longo prazos, já que trata-se de uma questão que diz respeito também à economia brasileira.
Dessa forma, ele conclui que a missão do MMA não muda com o novo Código Florestal no que se refere à sustentabilidade dos ecossistemas e recomendação para proteção das nascentes. "O Código Florestal faz diferença porque é uma legislação federal, mas todas as questões de sustentabilidade do agronegócio estão na mesa de todo dia", disse ele, que reconhece, entretanto, que o Código Florestal é o instrumento que norteia o agricultor.
Avaliação de especialistas – O sociólogo Sérgio Sauer, professor da UnB, considera que o novo Código Florestal foca o imediatismo na produção de alimentos para atender à demanda internacional, ignorando os danos à biodiversidade em longo prazo.
Segundo ele, uma das principais consequências da nova legislação ambiental será sobre a contaminação da água, pelo forte uso de agrotóxico nas áreas florestais, comprometendo a segurança alimentar.
Sauer avalia que os argumentos usados pelos deputados na aprovação do Código centram no tripé: produção de alimentos, exportação de commodities e no contexto de ilegalidade à maioria dos pequenos produtores rurais. Ainda que o argumento usado alegue a produção de alimentos, Sauer observa que o Brasil hoje avança muito na produção de grãos, principalmente de complexo soja (grão, farelo e óleo) para exportação, enquanto recua na produção de alimentos, como arroz, principalmente na região Sul do País, feijão e mandioca (a produção dessa última está estável há 20 anos).
Ele também considerou ilegal o não ressarcimento dos produtores rurais à sociedade pela exploração do solo brasileiro para o plantio agrícola.
APPs versus enchentes nas cidades – O consultor da Ackermann Consultoria Ambiental, Márcio Ackermann, rebateu a opinião do secretário de Biodiversidade e de Florestas do Meio Ambiente de que o novo Código Florestal não pode ser o único mecanismo usado na proteção florestal do País. "Ele representa muito. É um crime que está sendo cometido aqui [na Câmara dos Deputados]. Espero que a presidente Dilma reverta o que foi aprovado aqui", disse Ackermann, geógrafo pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP), mestre pelo Instituto Tecnológico de São Paulo (IPT/SP) e que possui 25 anos de experiência na área ambiental.
Ele chamou de "irresponsáveis” os deputados que ignoraram a importância que exercem as Áreas de Preservação Permanentes (APPs) nas áreas urbanas e na zona rural. "Aqui o debate foi em defesa das grandes propriedades de terras e da produção agrícola. O escopo geral não foi republicano e nem de proteção ao bem público", analisou.
Prejuízos à sociedade civil - Segundo ele, a ocorrência de enchentes e alagamentos em capitais, como São Paulo, por exemplo, é reflexo da falta de aplicação da legislação de APPS, gerando às vezes mais prejuízos à sociedade do que o reflorestamento estratégico nas cidades. Segundo ele calcula, cada enchente que ocorre na capital paulista, por exemplo, gera prejuízos de R$ 65 milhões. Além disso, são desembolsados R$ 300 milhões para construção de cada piscinão de 300 metros quadrados (m2). Ele citou o caso da Avenida Paulista, o coração da cidade de São Paulo, ainda que seja uma APPs em um topo de morro, "ninguém" sugere o reflorestamento dela em sua plenitude. "Temos instrumentos tecnológicos que podem ajudar nessas questões (a melhorar o reflorestamento da avenida)", disse. Ele acrescenta que mais de 50% das residências de famílias de baixa renda, de algumas capitais brasileiras, estão assentadas em APPs, às margens de rios.
Baseados em estudos do IPT, o geógrafo acrescentou que a poluição de rios que cortam a capital paulista, como o Tietê, faz com que o déficit hídrico paulistano seja semelhante ao do Nordeste. Conforme conclui o consultor, em vez de o Brasil avançar nas políticas públicas voltadas ao reflorestamento e de reversão de déficit hídrico retrocede 50 anos.
(Viviane Monteiro - Jornal da Ciência)
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