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sexta-feira, 27 de abril de 2012

Ministério do Meio Ambiente vai analisar impactos negativos do Código Florestal

O Ministério do Meio Ambiente (MMA) fará uma análise técnica sobre o impacto  do Código Florestal, aprovado quarta-feira (25) na Câmara dos Deputados. O  secretário de Biodiversidade e Florestas do ministério, Roberto Cavalcanti,  informou na quinta-feira (26) que o pedido é da ministra  Izabella Teixeira.

Arte copiada do Google
O texto aprovado pelos deputados não agradou ao governo  que apoiava a versão apreciada pelo Senado Federal em dezembro, nem a especialistas  ambientais e nem a cientistas.

"O Ministério do Meio Ambiente terá de fazer  uma avaliação em resposta à uma orientação superior", disse o  secretário, em audiência realizada na Comissão do Meio Ambiente para avaliar o impacto da nova legislação.

Mediada pelo líder do Partido Verde, deputado  Sarney Filho (PV-MA), a audiência teve a presença de especialistas em meio  ambiente e de acadêmicos que criticaram com veemência a decisão da Câmara.  Eles esperam que a presidente Dilma Rousseff vete o texto para  reverter  os retrocessos que o Código representa para a sustentabilidade  ambiental nacional. A avaliação majoritária é de que o texto aprovado pelos  deputados atende a negociações políticas e à bancada ruralista.

Crime ambiental - O consultor da Ackerman Consultoria Ambiental, Márcio Ackermann, chamou de  "irresponsáveis" os deputados que aprovaram o Código Florestal que,  segundo avalia, representa um "crime" à biodiversidade brasileira.

Com opinião semelhante, o senador Rodrigo  Rollemberg (PSB-DF), presidente da comissão que analisou o Código no Senado, e  iniciou a sessão na comissão, lamentou o retrocesso ocorrido na Câmara dos  Deputados. Ele enumerou os principais problemas do novo texto que deverá  levar à uma insegurança jurídica, considerando que toda a negociação política  costurada no Senado foi perdida e pediu para a presidente Dilma exercer o seu  direito de veto, a mesma opinião de Sarney Filho.

"Apesar de falar de um tema quase pós-morte,  acredito que perdemos a batalha, mas não perdemos a luta", complementou o  sociólogo Sérgio Sauer, professor da Universidade de Brasília (UnB), que tem foco  em reforma agrária e em desenvolvimento rural sustentável.

 Em sua palestra, o secretário de Biodiversidades  e de Florestas do ministério disse que as discussões sobre o Código  Florestal, mesmo que esteja aprovado, ainda não se esgotaram e que o  resultado da votação não representa uma derrota para o governo. “Temos de  fazer uma análise técnica em relação à votação do Código ", explicou  Cavalcanti.

As análises da equipe técnica do MMA serão nos  aspectos ecológicos, no impacto das mudanças do regime de proteção aos  processos de ecossistemas e de sustentabilidade dos processos biológicos. Já  no que se refere à anistia às multas de produtores rurais, Cavalcanti  respondeu que não cabe ao órgão analisar os pontos jurídicos do Código.

Exigências  internacionais - Independentemente da aprovação do polêmico  Código Florestal na Câmara, Cavalcanti acredita que permanecem os problemas para  o produtor rural sobre as cobranças do mercado internacional na segurança  alimentar alinhada à sustentabilidade no campo.

Como exemplo, ele afirmou que uma comissão da  China desembarcou em Brasília, na semana passada, interessada nas políticas  brasileiras destinadas à proteção da biodiversidade, combinadas com a produção  de alimentos, para os próximos dez ou 15 anos. Hoje, a China é um dos  principais importadores de commodities agrícolas e minerais do Brasil.

  Diante de tal cenário, Cavalcanti avalia que o desafio de associar a produção e  preservação ambiental e florestal interessa a todos os setores, tanto os  ambientalistas quanto o agronegócio.

Políticas  públicas - Nesse contexto, Cavalcanti destacou que o  desafio de adotar políticas públicas para a preservação ambiental implica em  um conjunto de ações que podem ser alcançadas com outros mecanismos. "O  Código Florestal não é o único e nem sua aprovação no Congresso Nacional  fecha a questão", analisou. Para ele, é preciso discutir planejamento de  médio e longo prazos, já que trata-se de uma questão que diz respeito também à economia  brasileira.

Dessa forma, ele conclui que a missão do  MMA não muda com o novo Código Florestal no que se refere  à sustentabilidade dos ecossistemas e recomendação para proteção das  nascentes. "O Código Florestal faz diferença porque é uma legislação  federal, mas todas as questões de sustentabilidade do agronegócio estão na  mesa de todo dia", disse ele, que reconhece, entretanto, que o Código  Florestal é o instrumento que norteia o agricultor.

Avaliação  de especialistas – O sociólogo Sérgio Sauer, professor da UnB, considera  que o novo Código Florestal foca o imediatismo na produção de alimentos para  atender à demanda internacional, ignorando os danos à biodiversidade em longo  prazo.

Segundo ele, uma das principais consequências da  nova legislação ambiental será sobre a contaminação da água, pelo forte uso  de agrotóxico nas áreas florestais, comprometendo a segurança alimentar.

Sauer avalia que os argumentos usados pelos  deputados na aprovação do Código centram no tripé: produção de alimentos,  exportação de commodities e no contexto de ilegalidade à maioria dos pequenos  produtores rurais. Ainda que o argumento usado alegue a produção de  alimentos, Sauer observa que o Brasil hoje avança muito na produção de grãos,  principalmente de complexo soja (grão, farelo e óleo) para exportação,  enquanto recua na produção de alimentos, como arroz, principalmente na região  Sul do País, feijão e mandioca (a produção dessa última está estável há 20  anos).

Ele também considerou ilegal o não ressarcimento  dos produtores rurais à sociedade pela exploração do solo brasileiro para o  plantio agrícola.
 
APPs  versus enchentes nas cidades – O consultor  da Ackermann Consultoria Ambiental, Márcio Ackermann, rebateu a opinião do  secretário de Biodiversidade e de Florestas do Meio Ambiente de que o novo  Código Florestal não pode ser o único mecanismo usado na proteção florestal do  País. "Ele representa muito. É um crime  que está sendo cometido aqui [na Câmara dos  Deputados]. Espero que a presidente Dilma reverta o que foi aprovado  aqui", disse Ackermann, geógrafo pela Pontifícia Universidade Católica  de São Paulo (PUC/SP), mestre pelo Instituto Tecnológico de São Paulo  (IPT/SP) e que possui 25 anos de experiência na área ambiental.

Ele chamou de "irresponsáveis” os deputados  que ignoraram a importância que exercem as Áreas de Preservação Permanentes  (APPs) nas áreas urbanas e na zona rural. "Aqui o debate foi em defesa das grandes  propriedades de terras e da produção agrícola. O escopo geral não foi  republicano e nem de proteção ao bem público", analisou.

Prejuízos à sociedade civil - Segundo ele, a ocorrência  de enchentes e alagamentos em capitais, como São  Paulo, por exemplo, é reflexo da falta de aplicação da legislação de APPS, gerando às vezes mais  prejuízos à sociedade do que o reflorestamento estratégico nas cidades. Segundo  ele calcula, cada enchente que ocorre na capital paulista, por exemplo, gera  prejuízos de R$ 65 milhões. Além disso, são desembolsados R$ 300 milhões para  construção de cada piscinão de 300 metros quadrados (m2). Ele citou o caso  da Avenida Paulista, o coração da cidade de São Paulo, ainda que seja uma  APPs em um topo de morro, "ninguém" sugere o reflorestamento dela em  sua plenitude. "Temos instrumentos tecnológicos que podem ajudar nessas  questões (a melhorar o reflorestamento da avenida)", disse. Ele  acrescenta que mais de 50% das residências de famílias de baixa renda, de algumas  capitais brasileiras, estão assentadas em APPs, às margens de rios.

Baseados em estudos do IPT, o geógrafo acrescentou  que a poluição de rios que cortam a capital paulista, como o Tietê, faz com  que o déficit hídrico paulistano seja semelhante ao do Nordeste. Conforme  conclui o consultor, em vez de o Brasil avançar nas políticas públicas  voltadas ao reflorestamento e de reversão de déficit hídrico retrocede 50  anos.

(Viviane Monteiro - Jornal da Ciência)





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