Por Marta Medeiros/ Academia Freudiana
Se
eu disser pra você que hoje acordei triste, que foi difícil sair da
cama, mesmo sabendo que o sol estava se exibindo lá fora e o céu
convidava para a farra de viver, mesmo sabendo que havia muitas
providências a tomar, acordei triste e tive preguiça de cumprir os
rituais que faço sem nem prestar atenção no que estou sentindo, como
tomar banho, colocar uma roupa, ir pro computador, sair pra compras e
reuniões – se eu disser que foi assim, o que você me diz? Se eu lhe
disser que hoje não foi um dia como os outros, que não encontrei energia
nem pra sentir culpa pela minha letargia, que hoje levantei devagar e
tarde e que não tive vontade de nada, você vai reagir como?
Você
vai dizer “te anima” e me recomendar um antidepressivo, ou vai dizer
que tem gente vivendo coisas muito mais graves do que eu (mesmo
desconhecendo a razão da minha tristeza), vai dizer pra eu colocar uma
roupa leve, ouvir uma música revigorante e voltar a ser aquela que
sempre fui, velha de guerra.
Você
vai fazer isso porque gosta de mim, mas também porque é mais um que não
tolera a tristeza: nem a minha, nem a sua, nem a de ninguém. Tristeza é
considerada uma anomalia do humor, uma doença contagiosa, que é melhor
eliminar desde o primeiro sintoma. Não sorriu hoje? Medicamento. Sentiu
uma vontade de chorar à toa? Gravíssimo, telefone já para o seu
psiquiatra.
A
verdade é que eu não acordei triste hoje, nem mesmo com uma suave
melancolia, está tudo normal. Mas quando fico triste, também está tudo
normal. Porque ficar triste é comum, é um sentimento tão legítimo quanto
a alegria, é um registro de nossa sensibilidade, que ora gargalha em
grupo, ora busca o silêncio e a solidão. Estar triste não é estar
deprimido.
Depressão
é coisa muito séria, contínua e complexa..
O texto na íntegra: “A tristeza permitida” de Martha Medeiros
Nenhum comentário:
Postar um comentário